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O sábio Patañjali, autor do Yogasūtra, é sempre representado
como tendo forma de serpente na parte inferior do corpo

O que são?

O rāja yoga, sistematizado pelo sábio Patañjali nos conhecidos YogaSútras, sistematiza e enumera o sistema ético sobre o qual a prática do yoga assenta e sem a qual a prática não produzirá o efeito pretendido. Também é traçado um caminho de conhecimento discriminativo e de meditação. O praticante aprende a lidar consigo mesmo, os seus medos, obstáculos internos, as latências inconscientes que alimentam sem cessar o fluxo do pensamento e que ditam muito do que somos e fazemos. Nesse processo de exploração do universo interno tornamo-nos cientes do que somos.

Os Yogasūtras são o texto clássico mais valorizado pela comunidade de ashtanga yoga, mas, como modelo de yoga, são suficientemente abrangentes para integrarem o haṭha yoga. O ashtanga yoga é hatha yoga.

 

O yoga ensinado por Patañjali é conhecido por vários nomes como Aṣṭāṅga yoga de Patañjali, Patañjala rāja yoga ou simplesmente como o clássico rāja yoga. Vejamos o que entende Patañjali por yoga. A definição de yoga encontra-se no segundo sūtra do primeiro capítulo – Samādhi Pāda.

Qualidades que somos e que desenvolvemos

Nos seus 196 aforismos, Patanjali delineia o processo de nos tornarmos inteiros, explica como devemos cultivar 10 qualidades (yamas e niyamas) para reconhecermos a nossa natureza como seres completos e felizes.
Quando estamos centrados na nossa natureza, estas qualidades brilham por si mesmas. Estes 10 atributos, os yamas e niyamas, são tradicionalmente considerados os preceitos éticos que estão na base de todos os ensinamentos do Yoga. A prática destes preceitos é mais importante do que qualquer outra prática dos 8 membros do ashtanga yoga. Isto porque sendo Patanjali tão lógico e sistematizado na exposição do seu texto, a proeminência dada a esses dois aspectos não será por acaso. Os yamas e niyamas são, na verdade declarações enfáticas do que somos e de como nos relacionamos com a nossa natureza, pois o que nos restringimos de fazer – nessas 10 recomendações – é, no fundo, de nos vermos como separados uns dos outros. Quando há um sentido de unidade entre todos, por que haveremos roubar algo de alguém? Assim como quando estamos intimamente ligados a alguém, não vamos ter qualquer acto de violência para com ele.

Usamos o Yoga não para nos corrigirmos ou punirmos, mas para vermos quem realmente somos. Para o Yoga é a desconexão com o ‘outro’ que está na base de todos os equívocos.

Como é que a nossa verdadeira natureza é de amor e de compaixão, quando no dia a dia nos vemos com pensamentos tão confusos, tão limitados, tão carentes, e nos vemos sitiados entre negatividade e emoções destrutivas?

Patanjali diz-nos que falhamos em reconhecer a nossa bondade intrínseca devido a uma incapacidade momentânea de compreender a vida silenciosa e omnipresente que se manifesta através de nós. E por que é que não falhamos nesse reconhecimento? Porque na maior parte do tempo o nosso modus operandi primário consiste em nos identificarmos e participarmos no movimento transitório de pensamentos, sentimentos, memórias, fantasias, sensações, ideias, julgamentos sobre nós e os outros. Esta panóplia de sensações, de experiências, de desejos e de aversões é tão convincente que passamos grande parte da nossa vida a acreditar que isso é o que somos e o que nos define. Tragicamente, vamos vivendo a acreditar que somos os nossos medos, as nossas raivas, e desapontamentos. Vamos vivendo convencidos de que somos o nosso corpo, as nossas rugas, os nossos sucessos e fracassos.

Esse é um dos motivos por que a prática de ásanas é tão importante: porque vamos percebendo em primeira mão que as nossas sensações, as nossas emoções, as nossas vitórias e limitações são apenas visitantes temporários. E quando conseguimos alguma quietdue na mente e permanecer nesse lugar de quietude, percebemos que o anfitrião de todos esses convidados é a nossa consciência que está sempre presente, imperecível.

Ou, como Patanjali, define no verso:

yogaścittavṛttinirodhaḥ || 2|| Yoga é a cessação das modificações da mente

O yoga é, então, definido através de 3 termos simples: chitta-mente; vrtti- actividade mental ou pensamento e nirodha- absorção ou cessação.

Os Yoga sutras são divididos em 4 capítulos, diz-se devido ao facto de que cada um deles representa o ensino dado a 4 discípulos diferentes.

O primeiro capítulo apresenta todo o terreno do Yoga- as suas características, obstáculos, e como lidar com os problemas que vão surgindo e o que acontece à mentee m consequência disso. Esse capítulo chama-se Samadhipada, por falar de Samadhi que significa complete absorção e união do indivíudo com o objecto de contemplação. Esse objecto pode ser qualquer coisa- ciência, arte, cosmos ou Deus.

Neste primeiro capítulo, Patanjali diz-nos que alguns dos presentes do yoga são uma clareza e discernimento, satisfação e plenitude, serenidade e pureza na acção. Para isso, ele começa por definir alguns dos grandes conceitos que sempre ocuparam filósofos e pensadores de todos os tempos: mente, consciência, fé, Deus.

Soluções para resolver problemas e cultivar a atenção:

  • Adoptar uma attitude positive perante os outros;
  • Técnicas de respiração correctas;
  • Análise regular e exaustiva do papel dos órgãos dos sentidos;
  • Questionamento sobre quem sou eu

Vimos ainda algumas práticas simples para começar e que nos podem ajudar a construir a nossa casa de Yoga:

  1. Fazer escolhas que levem à tranquilidade estável
  2. Estabecer uma convicção fore e inabalável
  3. Estar atento ao colorido dos pensamentos
  4. Treinar a mente para ser focada
  5. Discernimento a todo os níveis e desapego
  6. Prática, prática, prática

70X7

16 de Abril, 2020

“Voltai os vossos olhares para a frente; quanto mais vos elevardes pelo pensamento acima da vida material, menos sereis magoados pelas coisas da Terra”.

O livre-arbítrio, enquanto lei base da progressão da cada um de nós, permite ao Homem viver o equívoco.

Jesus ensinou-nos a dizer pela oração do Pai-Nosso: “Perdoai-nos, Senhor, as nossas faltas, assim como nós perdoamos aos nossos devedores”. Neste sentido, uma compreensão contrária sobre o perdão, é fruto da ignorância espiritual, e uma fabricação dos homens onde impera a lei do medo no lugar do uso da razão.

Coisas simples como agradecimento, perdão, solidariedade:

  • Permitem alinhar o pensamento para com outros de forma activa.
  • Criam um canal de comunicação entre o nosso íntimo e aqueles a quem a dirigimos.
  • O indivíduo que vive segundo as premissas da solidariedade vive menos centrado em si, pois deposita grande atenção no trabalho de equipa e no bem comum. Uma sociedade que vive com esta orientação é mais protegida e desenvolvida, pois cada indivíduo tem sobre si a atenção e o cuidado de muitos outros. Uma sociedade de indivíduos unicamente preocupados com o seu próprio bem-estar é egoísta, pelo que é mais desprotegida. Aqui, cada um tem somente o seu próprio olhar a cuidar de si.
  • O primeiro terá mais sucesso porque pode somar às soluções que procura, a inteligência de outros – daqueles que se preocupam com ele de forma indulgente, e que são com ele solidários. É uma vivência solidária reciproca, em equipa, em comunidade. O valor total de inteligência dirigida em favor daquele que age de forma solidária e indulgente para com outros, inclui a resultante da interacção social (física), mas também a espiritual, daqueles que promovem e a quem promovem o bem. Há aqui um efeito multiplicador que nos esquecemos de contabilizar porque ainda nos é difícil assimilar o alcance da mensagem de Jesus.
  • O segundo cuida somente de si, e porque negligencia os outros, é provável que receba desses a mesma negligência. Sim, vivemos numa rede social, mas também espiritual.

O esquecimento das ofensas é próprio da alma elevada, que paira acima dos golpes que lhe possam desferir. Uma é sempre ansiosa, de sombria susceptibilidade e cheia de amargura; a outra é calma, pacífica e caridosa.

“Quantas vezes perdoarei a meu irmão? Perdoar-lhe-eis, não sete vezes, mas setenta vezes sete vezes”. Aí tendes um dos ensinos de Jesus que mais nos devem percutir a inteligência e mais alto falar ao coração. Ele, o justo por excelência, responde a Pedro: perdoarás, mas ilimitadamente; perdoarás cada ofensa tantas vezes quantas ela te for feita; ensinarás a teus irmãos esse esquecimento de si mesmo, que torna uma criatura invulnerável ao ataque, aos maus procedimentos e às injúrias; serás brando e humilde de coração, sem medir a tua mansuetude; (….) Se os actos do outro vos prejudicaram, mais um motivo aí tendes para serdes indulgentes, porquanto o mérito do perdão é proporcionado à gravidade do mal. Nenhum merecimento teríeis em relevar os agravos dos vossos irmãos, desde que não passassem de simples arranhões” (Simeão, 1862).

Além disso, perdoar aos inimigos é pedir perdão para si próprio; perdoar aos amigos é dar-lhes uma prova de amizade; perdoar as ofensas é mostrar-se melhor do que era. “Nunca perdoarei”, é uma frase sem sentido, pois pronuncia a sua própria condenação. Quem sabe, aliás, se, descendo ao fundo de vós mesmos, não reconhecereis que fostes o agressor? Quem sabe se, nessa luta que começa por uma alfinetada e acaba por uma ruptura, não fostes quem atirou o primeiro golpe, se vos não escapou alguma palavra injuriosa, se não procedestes com toda a moderação necessária?

Todavia, há duas maneiras bem diferentes de perdoar: há o perdão dos lábios e o perdão do coração. Muitas pessoas dizem, com referência ao seu adversário: “Eu lhe perdoo”, mas, interiormente, alegram-se com o mal que lhe advém, comentando que ele tem o que merece. Quantos não dizem: “Perdoo” e acrescentam. “mas, não me reconciliarei nunca; não quero tornar a vê-lo em toda a minha vida.”

Aqui recorremos ao que nos ensinou Paulo de Tarso: “O esquecimento completo e absoluto das ofensas é peculiar às grandes almas; o rancor é sempre sinal de baixeza e de inferioridade. Não olvideis que o verdadeiro perdão se reconhece muito mais pelos atos do que pelas palavras”.

Com o devido tempo, todos somos capazes de perdoar e de ser perdoados.

Isto não significa que temos de trazer para a nossa intimidade pessoas a quem achamos que nos fizeram grandes ofensas, apenas que as podemos perdoar.

Um caminho de 8 passos

11 de Abril, 2020

Paschima namaskar

 

Os 8 passos enumerados por Patanjali no seu livro sobre ashtanga yoga (há cerca de 200 D.C). Na sabedoria indiana, é comum agrupar práticas e ensinamentos : os 8 membros do ashtanga yoga, os 4 Vedas, as 108 upanishads, as 24 categorias de experiência e por aí fora. Enumerar ajuda a organizar as coisas na mente.

Baseando-me no livro de Krnsamacharya, esses 8 membros do ashtanga yoga são:

  1. Yama: as nossas atitudes para com o que nos rodeia
  2. Niyama: as nossas atitudes para connosco
  3. Asana: a prática de posturas psicofísicas
  4. Pranayama: a prática de técnicas respiratórias
  5. Pratyahara: a restrição no uso dos nossos sentidos, optando pelo recolhimento destes
  6. Dharana: a capacidade de dar uma direcção à mente
  7. Dhyana: a capacidade de desenvolver interacções com o que procuramos compreender, através da meditação
  8. Samadhi: integração completa com o objecto que queremos entender: a plenitude da nossa natureza e a compreensão de uma inteligência superior a nós.

Lembramos que uma prática espiritual deve ser transformadora, não rígida.

Os yamas incluem:

Ahimsa (não-violência): ter consideração e respeito por todos os seres vivos, sobretudo os que se encontram em piores condições do que nós. Somos amigáveis e reduzimos a raiva, medo, ódio e sentimentos, pensamentos ou acções de violência para todos os seres vivos à nossa volta. É o equivalente a ‘não matarás’. A um nível mais profundo significa que somos totalmente livres de qualquer grau de agressividade ou de violência, não temos qualquer inclinação para acções, pensamentos ou sentimentos agressivos ou que prejudiquem de alguma forma algum ser vivo. Assim, este valor implica que nos nossos corações e mentes só haja amor e liberdade.

Satya: ter apenas comunicações verdadeiras através das nossas palavras, escrita, gestos, sentimentos e acções. Inclui a capacidade de comunicar com sensibilidade, sem mentiras e com reflexão. No fundo, é  a honestidade, mas falando sempre a verdade de forma a que não magoemos ninguém. Quem consegue isto não pratica acções erradas.

Asteya: não cobiçar o que não é nosso. Desta forma, ganhamos a confiança de todos e podemos partilhar livremente. O não querer o que é dos outros refere-se não apenas a objectos, mas também a ideias, sonhos ou pensamentos.

Brahmacharya: moderação em todas as nossas acções. No seu melhor, é a moderação que dá a maior vitalidade ao indivíduo.

Aparigraha: não-ganância ou a capacidade de aceitar apenas o que é apropriado. O que não é ganancioso nem avarento, é seguro e confiante. É a capacidade de não estar sempre a saltar ansiosamente de desejo em desejo, sobretudo pelo que é dos outros.

Patanjali nota que ninguém domina, logo no início do seu caminho espiritual, estas atitudes na sua totalidade. Os obstáculos inerentes ao exercício de cada um deles vão tornando-se mais evidentes quando identificamos as razões pelas quais fazemos o seu oposto.