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Asana, corpo e conexão

1 de Janeiro, 2023

“That which is hard in your body is of the nature of the Earth, and it supports the other organs. Hair, skin, nerve, flesh and bones are the miniature forms of the different aspects of Earth. Sound, touch, form, taste, and smell are the qualities of Earth.”  — M.R. Jambunathan, The Yoga Body (1941)

Conectar-se com o corpo é conectar-se com a Terra, pois o nosso corpo é apenas uma extensão deste planeta. Assim, enquanto caminhamos numa floresta ou praticamos asanas no nosso tapete possam parecer muito diferentes, ambos honram o mesmo espírito universal. Ambas trazem-nos de volta ao contacto com o que é a nossa natureza essencial.

É como John O’Donohue escreveu uma vez: “Os nossos corpos sabem que pertencem; são as nossas mentes que tornam as nossas vidas tão sem-abrigo. Não deixe que a sua mente o leve para longe de casa. Só há uma terra e só tens um corpo. Portanto, agora não é o momento para abandonar a sua prática de āsana, mas pode ser o momento perfeito para reavaliar a sua abordagem.

Porque estas posturas são mais do que simplesmente anatomia, abrangendo mais do que apenas músculos e ossos. Āsana é um canal para a natureza, uma expressão da força criativa que reside dentro de nós e em todo o lado. E a nossa prática, uma manifestação física de uma fonte universal.

“A Terra é a nossa origem e destino. Os ritmos antigos da Terra instigaram-se nos ritmos do coração humano. A terra não está fora de nós; é dentro: a argila de onde a árvore do corpo cresce.”

O universo não manda sinais

18 de Setembro, 2021

 

O universo dá sinais? Não.

Peço desculpa se ofendo alguma crença, mas o universo não dá sinais a ninguém.

Sim, o Universo tem sinais, inclusive tem um padrão de sinais de rádio repetido cuja origem, descobriu-se recentemente, remonta a uma galáxia a cerca de 500 milhões de anos-luz da Terra. E, por enquanto, só temos evidências científicas da existência de sinais de rádio no universo e não são dirigidos a ninguém em particular.

Por isso, já era tempo de deixarmos cair essa desculpa para justificar o que quer que seja que aconteça na nossa vida. A pessoa não acredita em Deus, não acredita na existência de outros seres inteligentes que possam – em diferentes planos vibracionais da existência influenciar a sua vida e psique – mas depois acredita que o universo manda sinais para alguém e que o universo está interessado nos nossos problemas individuais? Lamento, mas não está.

“Mas então, o universo não me diz, por sinais, qual é o meu propósito de vida?”

Não, o universo não é uma entidade inteligente nem criadora. Sabemos que ele faz e contém coisas inusitadas, mas mandar sinais para cada um de nós não é uma delas. Hoje sabe-se que o universo é composto por energia e matéria escuras e pela energia e matéria que nos compõe.

“Mas e o propósito da minha vida…”

A única coisa que importa dizer é que não interessa qual é a tua profissão, quantos graus académicos tens ou se tens algum, o tamanho da tua conta bancária, se tens família ou não, se te dedicas ao yoga, à jardiangem ou a ser bombeiro. Se há algum propósito na nossa vida é que nos voltemos para os interesses da alma. O nosso aperfeiçoamento moral é tudo o que mais importa (já agora, acho que basta olhar o mundo à nossa volta para percebermos isso). É claro que a nossa caminhada segue e está incluída no que acontece no universo visível e invisível. Ninguém vive realmente sem objetivo existencial. O ser humano suporta qualquer tipo de perda, naturalmente dentro dos seus limites emocionais, não, porém, a perda do objectivo existencial.

Se o indivíduo perde a motivação para o crescimento interno, e a conquista de valores externos, porque se encontra sob recriminação e culpa, incerteza e desinteresse existencial, a sua vida torna-se exaustiva e doentia, porque destituída de ideais e de realizações.

A existência saudável é dinâmica, cheia de acções bem sucedidas e outras menos, que se inter-relacionam num panorama de acertos e de erros, enganos esses que se convertem em aprendizagem para futuras conquistas que nos ajudam a crescer.

A vida sem sentido é uma experiência sem vida. O vir-a-ser dá sentido existencial à vida, promovendo-a e dignificando-a, tornando-a saudável e bela.

Estabelecido, portanto, um roteiro psicoterapêutico valioso ou organizada uma simples proposta de bem-estar pessoal, o vir-a-ser é essencial na estruturação da saúde do indivíduo, que se trabalha motivado pa

O tempo da vivência terrestre pede sempre que lhe demos um sentido útil, que procuremos saber qual é a razão de fazermos o que fazemos e de ser como somos. Senão, para quê passarmos tanto tempo pelas experiências do corpo biológico, de enfrentarmos tantas dificuldades, de superarmos variados embates, sem que tenhamos consciência de sua razão?

Para tudo o que fizer ou deixar de fazer, que haja um sentido claro ou uma ponderável razão.

Não é preciso filosofarmos sobre por que ficamos a dormir até mais tarde ou porque gostamos da cor azul,  mas quando se tratar de acções que terão peso sobre a nossa vida, aí sim, busquemos sempre uma razão para fazê-las.

Procure encontrar e compreender os motivos pelos quais está no mundo, no tempo presente, nas suas circunstâncias, e não viva ao sabor da sorte. E sobretudo, aceite o sofrimento, mas não se apegue a ele. Ninguém nasceu para sofrer nem culpado de coisa alguma. Quando nos fechamos num sofrimento inútil e prolongado, só desperdiçamos oportunidades. É possível quebrar esse ciclo vicioso e viver com mais ânimo, realismo e com a certeza de que podemos conduzir a nossa própria vida. Nós e não o universo.

Quando se sentir impotente e sem fé, pergunte-se o que lhe falta. E vai ver que só lhe falta esperança.

“O futuro bem entendido está no presente bem vivido”

Sugestão de leitura: Man’s search for meaning, Viktor Frankl

 

7 formas de lidar coma raiva

16 de Agosto, 2020

Paschima namaskarasana.

Há muito com que nos sentirmos zangados hoje em dia. E não só por causa da pandemia que estamos a atravessar. Há esta ideia de que as coisas deviam ser de uma determinada forma e é possível que algumas pessoas se sintam frustradas e com raiva por não terem outras soluções ou simplesmente por não terem uma solução de longo prazo infalível.

Como qualquer emoção, a raiva é normal e saudável. Todas as nossas emoções dizem-nos algo e ensinam-nos muito, ajudando-nos a processar as experiências com o mundo.

Mas é importante saber lidar com a raiva, pois não queremos estar à mercê dessa emoção, sobretudo numa altura em que há muitas descargas emocionais e muitos ‘nervos à flor da pele’.

O que antes se fazia para lidar com as nossas emoções: sair com amigos, viajar, etc. já não é, por agora, possível.

Na verdade, como dizia Śrī Śaṅkarācārya, a raiva nada mais é do que uma expressão da dor e da expectativa.

Deixo aqui algumas sugestões:

  1. Ouve as tuas emoções e pensamentos e, depois, vai mais fundo.

Identifica e reconhece os pensamentos e emoções que te estão a inundar a cabeça. Quando alguém diz: “Não aguento mais”, isso faz escalar uma espiral negativa de emoções. Quando dás por ti a pensar de forma catastrófica, muda o tom do pensamento. Pensa algo como : “eu consigo fazer isto hoje” e repete este ‘mantra’ internamente todos os dias se for preciso. Quando dividimos a nossa raiva ou frustração em pequenas partes, torna-se mais fácil de lidar com ela.

Estamos a viver um momento de soluções de curto-prazo. Depois de teres dado um passo atrás para determinar exactamente o que estás a sentir, vai mais fundo e aprofunda por que te estás a sentir dessa forma. Faz uma pausa e reflecte, sobretudo se acabaste de experienciar um pico de raiva.

Pergunta a ti mesmo(a): “O que aconteceu? O que me efureceu naquele momento?”. Se a resposta não for óbvia, escreve sobre isso num diário. Mais tarde vais poder identificar padrões: é possível que sintas mais raiva nas mesmas alturas do dia, ou quando estás com certas pessoas. Tudo isso é informação que podes usar para processar as tuas emoções e arranjar as soluções à tua medida.

O lado bom da raiva é que nos diz que algo não está bem connosco. E, tudo bem que vivas com expectativas, mas deixa que as expectativas incluam obstáculos também. O que pode dar errado vai dar errado. Inclui essa ideia nas tuas expectativas. Esta é uma afirmação muito sensata e não significa que desejes ou façass as coisas para darem errado. É, de facto, uma afirmação bastante positiva.

  1. Mantém a curiosidade sobre pessoas.

Quando achamos que as pessoas deviam agir assim ou assado, criamos expectativas e estas criam mais tensão e frustração. Lembra-te que nunca sabemos as reais intenções das pessoas, sobretudo através de um ecrã.

Presumimos demasiado acerca das outras pessoas e poucas vezes as ouvimos realmente. Agora, ser curioso acerca das pessoas não é querer (e muito menos consumir) o que muita gente despeja nas redes sociais sobre as suas vidas privadas. A vida pessoal e privada devia manter-se fora das redes e manter-se privada, apesar de todas as alterações que o conceito de privacidade tem vindo a sofrer.

Mantém a porta aberta para conversas reais, com pessoas reais e não com posts. Isto pode neutralizar a tua raiva.

  1. Faz exercício físico. Sim, yoga, mas não só.

Muitas vezes o melhor que há a fazer quando estamos zangados é transpirar muito. Fazer algo fisicamente exigente ajuda-nos a fazer um reset. Não tem de ser exercício físico feito de forma extenuante. Pode bastar uma boa técnica de respiração, como a respiração diafragmática.

E orientação especializada e profissional nesta área é indispensável.

4. Se achares que é mesmo preciso, procura ajuda profissional.

  1. Tem a tua playlist de músicas preferidas sempre à mão.

A música equilibrada é uma das melhores terapias para reequilibrar a tua energia e o campo vibratório da tua casa. Se tiveres uma lista de músicas de que gostas e que sabes que te acalmam, podes usar quando surge aquele pico de raiva.

  1. Usa as tuas reservas de energia emocional

A raiva desgasta-nos e deixa-nos KO. Tens de encontrar um equilíbrio entre usar a raiva para uma mudança em ti sem ficares exausto(a). A raiva aumenta a nossa batida cardíaca e tensão arterial. O truque está em encontrar estratégias que te ajudem a acalmar, como, por exemplo, dar um passeio na rua ou na praia. Neste caso, só queremos limitar os efeitos do pico de raiva. Ou podes canalizar a energia que vem da raiva para te tornares um activista por alguma causa.

  1. Encontra um ombro realmente amigo

Por vezes, só precisamos de ventilar. Telefona a um amigo ou a alguém em quem confies e possas simplesmente desabafar. Alguém que te possa ouvir simplesmente. Este tipo de troca pode não só ajudar-te a processar a emoção que estás a sentir, mas também o facto de verbalizares o que sentes e o porquê, ajuda a ganhar perspectiva sobre os teus próprios sentimentos, a encará-los com mais objectividade e, portanto, com menos dor.

 

Respirar nas relações

27 de Maio, 2020

 

A admiração é o oxigénio do desejo e do amor a dois. O amor maduro incentiva, estimula, promove e partilha a alegria do crescimento do outro e das suas realizações. ⁣⁣
⁣⁣
Saber admirar é uma arte que só desenvolvem aqueles que constróem autoestimas seguras e não precisam de diminuir o outro para se engrandecer nem ignorar os feitos e virtudes alheias para esconder a sua inveja e sensação de pequenez. ⁣⁣
⁣⁣
Quem se sustenta no reconhecimento das próprias capacidades, auto-referenciado, deseja que o outro faça brilhar cada vez mais a sua luz e voe o mais alto que desejar e puder. Quando é assim, o amor torna-se uma dança de estímulos e conquistas, pessoais e a dois, num crescimento contínuo. ⁣⁣

Aceitação

Nas aulas da Gita, temos falado muito deste valor: aceitação.

Aceitar-se a si e ao outro é libertador. Só o que é imperfeito evolui e cresce. ⁣

Longe de ser uma especialista no assunto e baseando-me na observação atenta dos que me rodeia, para que uma relação de casal resulte devemos permitir ao outro alguns ‘pecados’.
O perfeccionismo e a postura infantil de exigência destróem os brotos promissores de amores possíveis. ⁣

A relação nasce da atracção, sustenta-se na admiração e frutifica na alegria da partilha de objectivos e sonhos comuns, na complementaridade das imperfeições e das potencialidades. ⁣

A relação a dois é feita muito mais de ajustes do que de acordos. É no balanço da viagem, sobre as pedras dos desafios, que as arestas se aparam e os que amam se acomodam ao real e ao possível, com maior conforto. ⁣Um relacionamento afectivo aprofunda-se quando o casal mergulha na entrega e na relação. Inicialmente, cada um mergulha na sua própria história, idealizações, carências e virtudes, para se consciencializar e conectar à força que vem da sua própria família, de dentro de si mesmo.Depois, juntos, mergulham na aprendizagem e na arte de oferecer ao outro o melhor de cada momento e de receber o melhor que o outro possa e queira oferecer. Lado a lado, um passo de cada vez, constróem aquilo que seja possível, dentro dos seus sonhos, superando obstáculos, vencendo desafios e aprofundando sempre a descoberta de si mesmos e do outro na intimidade e nas construções transformadoras da partilha e do amor a dois. ⁣⁣

Quem aprende a rir de si mesmo com leveza também aprende a encantar-se com o outro, com compaixão e respeito. Aí o amor floresce. ⁣

(Lembrete: um casamento perfeito é aquele em que duas pessoas imperfeitas se recusam a desistir uma da outra)

O trabalho começa no tapete e prolonga-se para além dele. Do denso ao subtil. Do impossível ao possível. 

O corpo é instrumento
De ser feliz, não de pesar.
É um desdizer que nos diz
Em cada hora, momento
É instrumento de ser feliz
Não de doer, nem magoar.

É barca de ser e singrar
Com alento, não de choro.
Dá prazer, e não lamento
Para querer, sem crer estar;
Pra combater o tormento
Sem laxismo nem decoro,
O corpo é instrumento
De dar prazer, não dá penar.

O corpo é instrumento
De ser feliz, não de pesar,
Seja rápido ou lento,
O corpo é instrumento
Não de doer, mas de amar.

O corpo quer só bom trato
E atenção, pra conseguir
Uma plena realização.
Não é pedra no sapato
Ou ingrato por condição
De coxeio, mas de sorrir.

Meio de gozo sem perversão
Nem ditado, que premeia,
Ou círculo quadrado,
Mas diz sim, se sim; não, se não
Em todo e qualquer lado
Se apraz, não esperneia
Meio de gozo sem perversão
Nem ditado que permeia,
O corpo é instrumento
De ser feliz, não de pesar,
Seja rápido ou lento,
O corpo é instrumento
Não de doer, mas de amar.

Seguir a verdade

30 de Abril, 2020

“Antes, seguindo a verdade em caridade, cresçamos em tudo  – Paulo.

 

Porque a verdade participa igualmente da condição relativa, inúmeros pensadores enveredam pelo negativismo absoluto, convertendo o materialismo em zona de extrema perturbação intelectual.

Como interpretar a verdade, se ela parece tão esquiva aos métodos de apreciação comum?

Alardeando superioridade, o cientista oficioso assevera que o real não vai além das formas organizadas, à maneira do fanático que só admite revelação divina no círculo dos dogmas que abraça.

Paulo, no entanto, oferece indicação proveitosa aos que desejam penetrar o domínio do mais alto conhecimento.

É necessário seguir a verdade em caridade, sem o propósito de encarcerá-la na gaiola da definição limitada.

Convertamos em amor os ensinamentos nobres recebidos. Verdade somada com caridade apresenta o progresso espiritual por resultante do esforço. Sem que atendamos a semelhante imperativo, seremos surpreendidos por vigorosos obstáculos no caminho da sublimação.

Necessitamos crescer em tudo o que a experiência nos ofereça de útil e belo para a eternidade, mas não conseguiremos a realização, sem transformarmos, diariamente, a pequena parcela de verdade possuída por nós, em amor aos semelhantes.

A compreensão pede realidade, tanto quanto a realidade pede compreensão.

Sejamos, pois, verdadeiros, mas sejamos bons.”

 

 

As estrofes da Gītā que mencionam os 20 valores são:

amānitvam adambhitvam ahiṃsā kṣāntir ārjavam |
ācāryopāsanaṃ śaucaṃ sthairyam ātmavinigrahaḥ || 13.8 ||

Ausência de vaidade, ausência de pretensão, não-violência,
acomodação, retidão, dedicação ao mestre, pureza, persistência, autocontrole;

indriyārtheṣu vairāgyam anahaṃkāra eva ca |
janmamṛtyujaravyādhiduḥkhadośānudarśanam || 13.9 ||

desapego em relação aos objetos dos sentidos,
ausência de egoísmo e compreensão das limitações
do nascimento, a morte, a velhice, a doença e a dor;

asaktir anabhiṣvaṅgaḥ putradāragṛhādiṣu |
nityaṃ ca samacittatvam iṣṭāniṣṭopapattiṣu || 13.10 ||

ausência de apego à ideia de posse, ausência de apego
em relação aos filhos, o cônjuge, o lar e outros,
equanimidade constante independente da realização
do desejado ou do não desejado;

mayi cānanyayogena bhaktir avyabhicāriṇī |
viviktadeśasevitvam aratir janasaṁsadi || 13.11 ||

devoção inquebrantável a mim, [sabendo que] não há
outro [além de Īśvara], apreço por um lugar tranquilo,
ausência da necessidade da companhia de pessoas;

adhyātmajñānanityatvaṃ tattvajñānārthadarśanam |
etaj jñānam iti proktam ajñānaṃ yad atonyathā || 13.12 ||

busca constante do conhecimento de Ātma, apreciação
do sentido do conhecimento da verdade, isso é chamado
jñāna, conhecimento. O contrário a isto é ajñāna, ignorância.

Agora, em lista:

1. Amanitvam, ausência de vaidade, arrogância ou necessidade de elogio.

2. Adambhitvam, ausência de pretensão.

3. Ahiṁsā, não-violência.

4. Kṣānti, pacífica adaptabilidade.

5. Arjavam, retidão.

6. Acāryopāsanam, dedicação ao professor.

7. Śauchan, purificação.

8. Sthairyam, firmeza de propósito.

9. Ātma-vinigraha, comando sobre o pensamento.

10. Indriyartheśu vairāgyam, desapego em relação aos objetos dos sentidos.

11. Anahaṅkāra, ausência de identificação com as coisas do ego.

12. Janmamṛtyujaravyādhiduḥkhadośānudarśanam, reflexão sobre as limitações do nascimento, a morte, a velhice, a doença e a dor.

13. Aśakti, ausência de apego à ideia de posse.

14. Anabiśvaṅgaḥ putradaragṛhādiśu, equanimidade afetiva.

15. Nityam samacittatvam iśtaniṣṭopapattiṣu, equanimidade constante.

16. Bhaktir avyabhicāriṇī, devoção inabalável.

17. Viviktadeśa sevitvam, apreço por um lugar tranquilo.

18. Aratiḥ janasamsadi, apreço pela solitude.

19. Tattvajñānārthadarśanam, foco e clareza na verdade.

20. Adhyātmajñāna nityatvaṁ, disposição contínua para o autoconhecimento.

Niyamas

21 de Abril, 2020

Yamas e niyamas orientam o indivíduo para uma maior clareza na relação com tudo o que é externo e para uma maior profundidade em tudo o que é interno. Esforços nesta direcção são companhias constantes a todos os outros aspectos da prática e estudo do Yoga, sendo o processo sempre gradual.

Śaucan é a purificação. Mas é mais do que higiene do indivíduo e dos espaços onde circula. É uma atenção ao que será mantido e o que é eternamente limpo. É a percepção de que o que está sujeito a decair é o corpo, o externo; o que não decai é o que somos. A limpeza externa inclui os cuidados com o corpo, a alimentação, os hábitos desaconselhados como o uso de drogas, ou de alimentos tóxicos que gerem comportamentos condicionados e contraproducentes com o que se pratica no Yoga. A limpeza interna inclui uma selecção cuidado dos estímulos que damos à nossa mente, à dieta de pensamentos que alimentamos.

Santosha (contentamento) é a capacidade de estarmos confortáveis com o que temos e com o que não temos. A felicidade que vem com a aquisição de objectos ou experiências é invariavelmente temporária. Esta capacidade de cultivar um estado interior de permanente alegria, independentemente das circunstâncias externas é a chave para a felicidade total. É capacidade de saber viver a sua própria vida, fazendo o melhor que pode com o que tem.

Tapas é a remoção de impurezas físicas ou mentais através de hábitos correctos de sono, actividade, nutrição, trabalho e relaxamento. É conseguir apurar um ponto de eficiência e rigor no nosso quotidiano que nos permita superar os obstáculos quando é preciso exercitando a determinação, força de vontade concentrada, austeridade e um esforço sobre si próprio.

Como diz Kṛṣṇa na Bhagavadgītā: “Uma linguagem que não fira, verídica, amigável e benéfica, o estudo regular das escrituras, tal é o tapas da palavra. A serenidade e clareza de espírito, a doçura, o silêncio, o autodomínio, a total purificação do caráter, tal é o tapas consciente.

Svadhyaya é a capacidade de estudo motivada pela necessidade de rever e avaliar o nosso progresso. Quando desenvolvido ao seu nível mais elevado- um processo que se prolonga por toda vida até aos seus últimos momentos de vida – o estudo apropriado aproxima o indivíduo de uma compreensão do que é mais complexo.

Diz a Viṣṇu Purāṇa, VI:6.2:
“Do estudo deve-se passar ao Yoga.
Do Yoga deve-se passar ao estudo.
Pela perfeição no estudo e no Yoga,
a Consciência Suprema se manifesta.
O estudo é um dos olhos com que vemos o Ser.
O Yoga é o outro”.

Isvarapranidhana é uma reverência a uma inteligência superior ou a aceitação das nossas limitações perante essa inteligência e ordem superior. É nessa reverência que ganhamos confiança para direccionar as nossas mentes para essa inteligência superior em todas as nossas acções e pensamentos. A melhor definição de Īśvara pranidhāṇa está na Bhagavadgītābhavitam bhavati eva: “O que tiver que ser, será”.

 

O sábio Patañjali, autor do Yogasūtra, é sempre representado
como tendo forma de serpente na parte inferior do corpo

O que são?

O rāja yoga, sistematizado pelo sábio Patañjali nos conhecidos YogaSútras, sistematiza e enumera o sistema ético sobre o qual a prática do yoga assenta e sem a qual a prática não produzirá o efeito pretendido. Também é traçado um caminho de conhecimento discriminativo e de meditação. O praticante aprende a lidar consigo mesmo, os seus medos, obstáculos internos, as latências inconscientes que alimentam sem cessar o fluxo do pensamento e que ditam muito do que somos e fazemos. Nesse processo de exploração do universo interno tornamo-nos cientes do que somos.

Os Yogasūtras são o texto clássico mais valorizado pela comunidade de ashtanga yoga, mas, como modelo de yoga, são suficientemente abrangentes para integrarem o haṭha yoga. O ashtanga yoga é hatha yoga.

 

O yoga ensinado por Patañjali é conhecido por vários nomes como Aṣṭāṅga yoga de Patañjali, Patañjala rāja yoga ou simplesmente como o clássico rāja yoga. Vejamos o que entende Patañjali por yoga. A definição de yoga encontra-se no segundo sūtra do primeiro capítulo – Samādhi Pāda.

Qualidades que somos e que desenvolvemos

Nos seus 196 aforismos, Patanjali delineia o processo de nos tornarmos inteiros, explica como devemos cultivar 10 qualidades (yamas e niyamas) para reconhecermos a nossa natureza como seres completos e felizes.
Quando estamos centrados na nossa natureza, estas qualidades brilham por si mesmas. Estes 10 atributos, os yamas e niyamas, são tradicionalmente considerados os preceitos éticos que estão na base de todos os ensinamentos do Yoga. A prática destes preceitos é mais importante do que qualquer outra prática dos 8 membros do ashtanga yoga. Isto porque sendo Patanjali tão lógico e sistematizado na exposição do seu texto, a proeminência dada a esses dois aspectos não será por acaso. Os yamas e niyamas são, na verdade declarações enfáticas do que somos e de como nos relacionamos com a nossa natureza, pois o que nos restringimos de fazer – nessas 10 recomendações – é, no fundo, de nos vermos como separados uns dos outros. Quando há um sentido de unidade entre todos, por que haveremos roubar algo de alguém? Assim como quando estamos intimamente ligados a alguém, não vamos ter qualquer acto de violência para com ele.

Usamos o Yoga não para nos corrigirmos ou punirmos, mas para vermos quem realmente somos. Para o Yoga é a desconexão com o ‘outro’ que está na base de todos os equívocos.

Como é que a nossa verdadeira natureza é de amor e de compaixão, quando no dia a dia nos vemos com pensamentos tão confusos, tão limitados, tão carentes, e nos vemos sitiados entre negatividade e emoções destrutivas?

Patanjali diz-nos que falhamos em reconhecer a nossa bondade intrínseca devido a uma incapacidade momentânea de compreender a vida silenciosa e omnipresente que se manifesta através de nós. E por que é que não falhamos nesse reconhecimento? Porque na maior parte do tempo o nosso modus operandi primário consiste em nos identificarmos e participarmos no movimento transitório de pensamentos, sentimentos, memórias, fantasias, sensações, ideias, julgamentos sobre nós e os outros. Esta panóplia de sensações, de experiências, de desejos e de aversões é tão convincente que passamos grande parte da nossa vida a acreditar que isso é o que somos e o que nos define. Tragicamente, vamos vivendo a acreditar que somos os nossos medos, as nossas raivas, e desapontamentos. Vamos vivendo convencidos de que somos o nosso corpo, as nossas rugas, os nossos sucessos e fracassos.

Esse é um dos motivos por que a prática de ásanas é tão importante: porque vamos percebendo em primeira mão que as nossas sensações, as nossas emoções, as nossas vitórias e limitações são apenas visitantes temporários. E quando conseguimos alguma quietdue na mente e permanecer nesse lugar de quietude, percebemos que o anfitrião de todos esses convidados é a nossa consciência que está sempre presente, imperecível.

Ou, como Patanjali, define no verso:

yogaścittavṛttinirodhaḥ || 2|| Yoga é a cessação das modificações da mente

O yoga é, então, definido através de 3 termos simples: chitta-mente; vrtti- actividade mental ou pensamento e nirodha- absorção ou cessação.

Os Yoga sutras são divididos em 4 capítulos, diz-se devido ao facto de que cada um deles representa o ensino dado a 4 discípulos diferentes.

O primeiro capítulo apresenta todo o terreno do Yoga- as suas características, obstáculos, e como lidar com os problemas que vão surgindo e o que acontece à mentee m consequência disso. Esse capítulo chama-se Samadhipada, por falar de Samadhi que significa complete absorção e união do indivíudo com o objecto de contemplação. Esse objecto pode ser qualquer coisa- ciência, arte, cosmos ou Deus.

Neste primeiro capítulo, Patanjali diz-nos que alguns dos presentes do yoga são uma clareza e discernimento, satisfação e plenitude, serenidade e pureza na acção. Para isso, ele começa por definir alguns dos grandes conceitos que sempre ocuparam filósofos e pensadores de todos os tempos: mente, consciência, fé, Deus.

Soluções para resolver problemas e cultivar a atenção:

  • Adoptar uma attitude positive perante os outros;
  • Técnicas de respiração correctas;
  • Análise regular e exaustiva do papel dos órgãos dos sentidos;
  • Questionamento sobre quem sou eu

Vimos ainda algumas práticas simples para começar e que nos podem ajudar a construir a nossa casa de Yoga:

  1. Fazer escolhas que levem à tranquilidade estável
  2. Estabecer uma convicção fore e inabalável
  3. Estar atento ao colorido dos pensamentos
  4. Treinar a mente para ser focada
  5. Discernimento a todo os níveis e desapego
  6. Prática, prática, prática